Coloco gasolina no fogo porque me parece bem. Não me pergunto porquê.
O que sucede no dia seguinte, é que reconheço o odor entranhado nas roupas. Já passei por isto antes. Mas o resto são sombras na minha memória.
Todos sentimos este “appel du vide” de uma forma ou de outra. (Conseguiremos ultrapassá-lo, alguma vez?)
O desejo de destruir tudo torna-se demasiado para suportar de maneira razoável.
Quero colocar gasolina no fogo, outra vez. Quero ver tudo a arder furiosamente, pois não pretendo permitir que a raiva existencial que sinto, me sufoque.
O cheiro a fumo é nauseabundo. Atiro as roupas para a máquina de lavar, numa fúria incandescente.
Mergulho na cama como quem procura purificação. (Penitência, Senhor!) Mas é tarde de mais. A ira invade-me e faz-me pensar que já não tenho a capacidade de reconhecer outros sentimentos.
O meu coração está entupido de cinza e acendalhas adormecidas.
Quero colocar gasolina no fogo. São vários os momentos em que o meu cérebro flutua para essa opção.
Dou voltas e voltas entre os lençóis. Não há descanso para os amaldiçoados.
Sinto falta da sanidade básica. Pergunto-me se alguma vez a irei reconhecer na minha vivência. A esperança escasseia.
Coloco gasolina no fogo. O que aqui se ergueu, vou reduzir a insignificantes partículas. Quero que tudo desapareça ou pelo menos, sentir essa ilusão.
Salto da cama e decido tomar um duche. A água arrasta a ideia de que nada irá melhorar. A recém-adquirida frescura da minha pele reactiva a libertação de optimismo na minha mente.
Eu sei que eventualmente vou desejar colocar gasolina no fogo, mais uma vez. Até lá, vou tentar respirar um ar desprovido de essências de ruína própria.
(Conseguirei avançar?)